sexta-feira, 4 de maio de 2012

De trirremes e simpósios

Em Agrigento, na Sicília então dos gregos, havia uma casa conhecida como "trirreme". Trirreme é o nome dos barcos de guerra que compunham, por exemplo, a flotilha de Temístocles, com a qual gregos venceram os persas de Xerxes na decisiva batalha de Salamina (480 a.C.). A casa recebeu essa alcunha porque certa vez alguns jovens deram uma festa, ficaram muito bêbados e começaram a jogar na rua uma série de móveis e objetos da casa. Mais do que inebriados pelo vinho, diziam lutar contra uma tempestade no mar bravio e, seguindo a ordem de um capitão inexistente, jogavam ao mar a carga supérflua. O caso foi perpetuado pelo grego Timaeus de Taormina, na segunda metade do século IV a.C. "A estória pertence a uma rica tradição grega das metáforas marítimas da comunidade dos simpósios”, escreveu James Davidson, da Universidade de Warwick, na Inglaterra, no livro Courtesans & Fishcakes – The Consuming Passions o f Classical Athens (HarperPerennial/1999). “O alto mar representa a imensidão do vinho, a obliteração de pontos de referência”. O contrário dessa cena descontrolada poderia ser vista nos simpósios, a parte dos jantares da elite grega reservada à bebida e aos deleites filosóficos. Eram realizados em locais muito bem delimitados da casa, com mobílias (os famosos triclínios) apropriados, lista escolhida de convidados (de 7 a 11 pessoas, raramente 15), serviço rigoroso (o vinho diluído em água, servido da direita para a esquerda entre convidados dispostos quase em um círculo) e outras regras apropriadas para aquilo que os antropólogos gostam de apontar como modelo de socialização à mesa. Davidson, especialista em história clássica, reconstitui em detalhes não só a rotina dos simpósios e seus vinhos, mas de todos os deleites (da comida ao sexo) dos antigos atenienses. Muitos estudiosos já fizeram isso, é certo, mas com Davidson a pesquisa foi além dos textos clássicos, valorizando o material "vulgar", em tempos criticados em que a Arqueologia e suas “pedras” passaram a dominar e a guiar os estudos históricos e até mesmo sociológicos. Não à toa, o livro de Davidson foi elogiado pelo Washington Post como a última parte de uma trilogia, encabeçada por O Nascimento da Tragédia, de Nietzsche, e The Greeks and the Irrational, de E. R. Dodds. DC de 4 de maio de 2012

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