sexta-feira, 25 de março de 2011

Esculturas de terroir no Castello di Ama

Assim como Marco Pallanti trata seus vinhos – obras-primas da uva Sangiovese com todo o DNA da Toscana –, artistas por ele convidados também têm criado esculturas com a alma da sua propriedade, o Castello de Ama, cravado a 500 metros numa das colinas da comuna de Gaiole, em Chianti, província de Siena. A vinícola de Pallanti, no coração da zona histórica do Chianti Classico, foi fundada em 1972, sociedade de famílias romanas amantes da viticultura. Além dos vinhedos, cuidam de oliveiras e seus azeites. Mas como Pallanti e a mulher, Lorenza, também são apaixonados por arte, patrocinam com vivacidade de bons mecenas, desde o ano 2000, um verdadeiro museu de esculturas, com assessoria de Lorenzo Fiaschi e da Galleria Continua de San Gimignano. "Tínhamos a certeza de que o terroir dos nossos vinhos, este mágico canto da terra, teria o poder de falar ao coração dos artistas, estimular suas sensibilidades, e, através de um genius loci (a habilidade original de criação somada à especificidade de um lugar), ampliar os horizontes do conhecimento". Esculturas e instalações podem ser vistas ao lado de vinhedos (Daniel Buren), na capela do castelo (Anish Kapoor), e mesmo como pano de fundo da fileira de barricas (Kendell Geers).


http://www.castellodiama.com/english/index.php


DC de 25/3/2011

sexta-feira, 18 de março de 2011

Vinhos têm alma?

Uma borboleta azul sobre brilhantes cristais. A flor de cinco pétalas de um hibisco, dois beija-flores psicodélicos em pleno voo... As fotografias da cientista americana Sondra Barrett, com flagrantes da "alma dos vinhos", ganharam nos EUA status de arte, foram parar em galerias, camisetas, viraram cartões postais e agora estão perpetuadas no livro Wine's Hidden Beauty (Mystic Molecules Media/2009). Essas imagens multicoloridas de moléculas de vinhos já deram margem para que Sondra, PhD em bioquímica pela Medical School da Universidade da Califórnia, fosse incensada como uma espécie de musa New Age das vinícolas da sua região. Não há como negar a onda mística que a leva a pregar para agricultores da agricultura biodinâmica, atentos às vozes da Natureza. Os momentos do vinho que captura seriam também mensagens. Para os céticos, sussurros. Mas é inegável que o mergulho que a pesquisadora-fotógrafa faz em gotículas dos mais variados tipos de vinho, equipada com microscópios de última geração, pode ampliar nossa percepção desse universo, com suas intrincáveis variáveis. O apelo estético nessas obras vivas do acaso ainda se sobrepõe ao que nelas existe de informação científica a ser decifrada. Mas o que há de errado se elas forem apenas motivos para contemplação. O sonho de Sondra é ampliar a biblioteca de imagens, montagem que começou solenemente com um Inglenook Cabernet Sauvignon Reserve Cask 1941 do Vale do Napa. Quer agora ampliar o leque de "modelos" a fotografar: tintos e brancos, da França e da Itália, de vales e colinas, deste vinhedo e daquelas parreiras vizinhas, de cepas clássicas e outras menos conhecidas, autóctones, frutos tanto se safras excepcionais como daquelas nem tanto. Só assim será possível estabelecer padrões para comparações menos aleatórias. Alguns nexos entre formas e principalmente a idade das amostras começam a se descritos. Conforme o vinho vai envelhecendo, as estruturas moleculares passam a ficar cada vez maiores e mais complexas, escreveu Sondra, na revista inglesa The World of Fine Wine. Em geral, do ponto de vista químico, os ácidos aparecem em formatos angulares. Apresentado pois à imagem de um delgado e espinhento cacto podemos é estar diante de taninos de um grand cru Grands Echézeaux (Domaine de La Romanée-Conti) de quatro anos.

www.sondrabarrett.com/sitebuildercontent/sitebuilderfiles/abbreviatedwhb.pdf
www.WinesHiddenBeauty.com


DC de 18/3/2011

terça-feira, 15 de março de 2011

As garrafas do imperador

O vaidoso Napoleão Bonaparte (1769-1821) não tinha a mesa de gourmets entre seus símbolos de poder. Contam que no dia a dia fazia refeições de 15 minutos, sempre apressado, rotina só alterada em banquetes formais ou nos finais de semana com a família. Gostava mesmo é das sopas grossas, vegetais cozidos com pouca água, prato de soldado no front. Exceção talvez para o Frango à Marengo, preparado pelo seu chef Dunand a duras penas. Napoleão estava faminto. Vencera em jejum os austríacos, em uma das batalhas mais brilhantes de sua carreira, a Batalha de Marengo, ao sul de Turim, em 14 de junho de 1800. Dunand teve de rebolar para conseguir ingredientes naquele pedacinho da Itália. Além do frango, conseguiu lagostins, tomates, ovos e alho – e pão dos próprios soldados. O Frango à Marengo virou obsessão e passou a ser servido depois de campanhas vitoriosas. Já em relação aos vinhos, Napoleão dispensava algumas honras. "Sem vinho, sem soldados" é uma das frases a ele atribuída. A suas tropas era garantida uma ração de vinho diária e ele mesmo apreciava um bom tinto encorpado da Borgonha – de preferência um Chambertin – envelhecido de 5 a 6 anos, sempre com um pouco de água, emulando a infância na Córsega. Napoleão mantinha no front um ajudante para cuidar de seus estoques de tinto. Consta que o suprimento de Chambertin foi tão grande na aventura no Egito que trouxeram garrafas de volta, provando a resistência do vinho francês. Depois de enfrentar Kutuzov, antes do fogo em Moscou, chegou a cantar vitória com bom tinto. E lamentou a especulação em torno de vinhos que teriam sido roubados por cossacos e vendidos posteriormente em Paris, como "vinhos que sobreviveram à Moscou incendiada" e aos soldados mortos de frio. Outra reverência com chapéu bicorne era feita ao Champagne. Napoleão ficou amigo de Jean-Rémy Moët, dono da Moët Chandon) e fez várias visitas às adegas em Épernay, no coração da região. "Na vitória, você o merece; na derrota, você precisa dele", cunhou para sempre o imperador dos franceses. Mesmo no exílio em Santa Helena, teve suas taças cheias de Chambertin, Vin de Constance e Porto.

DC de 11/3/2011