sexta-feira, 27 de maio de 2011

Vinhos de Sonoma, com aura do Pacífico.

Os já reconhecidos vinhos das uvas Pinot Noir e Chardonnay produzidos na área costeira de Sonoma – uma das mais belas regiões vinícolas dos Estados Unidos – passam a ser mais divulgados com a recente criação da West Sonoma Coast Vintners. Essa associação de agricultores e vinicultores promete se dedicar a preservar e proteger a história, a paisagem e a cultura dessa faixa litorânea da Califórnia, incluindo os vinhedos de Annapolis, Fort Ross/Seaview, Occidental, Freestone, Green Valley e Sebastopol Hills. "Somos uma comunidade de agricultores, esta é nossa casa, não apenas nosso meio de vida, e somos orgulhosos disso", afirmam os líderes do movimento em seu site, que traz belíssimas fotografias das áreas associadas ao projeto. Um dos primeiros esforços na divulgação dos vinhos da região – e um prato cheio para quem planeja viajar pela Califórnia enogastronômica – é o West of West Wine Festival. O novo festival está programado para 5 a 7 de agosto num centro de artes em Occidental, a cerca de uma hora de São Francisco. Integram a nova associação as seguintes vinícolas: Benovia, Benzinger, Boheme Wines, Chassseur, Cobb, Failla Wines, Flowers Vineyard & Winery, Fort Ross, Freeman, Freestone Vineyards, Hawk Hill Vineyard, Hirsch Vineyard & Winery, Lioco, Littorai Wines, Marimar Estate Vinyards & Winery, Martinelli Winery, Patz & Hall Wine Company, Peay Vineyards, Ramey Wine Cellars, Red Car Wine Co., Small Vines, Whetstone Wine Cellars e Wind Gap. Os vinhedos da família Benzinger, por exemplo, que podem ser visitados num trenzinho puxado por um trator, estão plantados em solo vulcânico, resultado de explosões na Montanha de Sonoma há dois milhões de anos, o que faz hoje a diferença de seus vinhos.


DC de 28/05/2011

terça-feira, 24 de maio de 2011

Chenin Blanc no Château des Ormeaux

Ao lado do bosque do Château des Ormeaux, em Nazelles, na vizinhança de Amboise, Vale do Loire, seis fileiras da uva Chenin Blanc resistem bravamente. E servem como símbolo da vocação irrepreensível da região para os bons vinhos brancos. A nobreza sempre valorizou esses "jardins franceses" da Touraine, de boa caça e excelentes vinhos. O Château des Ormeaux foi erguido durante o reinado de Carlos X (1824-1830). Depois da II Guerra Mundial, passou 30 anos em completo abandono, até ser totalmente restaurado nos anos 1970. Hoje serve de hospedagem de charme para quem pretende visitar os vinhedos e castelos do Loire. Hospedados no château, eu e a família fomos paparicados pelo proprietário Emmanuel e guiados no passeio ao bosque pelo labrador Vic. Tomadas pelo mato e esquecidas no tempo, as fileiras de Chenin Blanc também foram redescobertas e resgatadas pelos empreendedores. Agora é possível degustar nas românticas instalações do château o vinho do seu próprio quintal. A Chenin Blanc é a cepa predominante dos vinhos de Vouvray, cidade no distrito de Touraine (a Arbois é permitida, mas raramente usada). O crítico Frank Prial lembra que o escritor François Rabelais (1494-1553), que viveu por ali, descrevia a sensação da perfeita acidez dos Vouvray : é "como tafetá". Gerald Asher escreveu na revista Gourmet, embasbacado, que esses vinhos têm rico aroma e sabor de mel, lembrando até "impossíveis frutas tropicais".

http://www.chateaudesormeaux.fr/accueil_eng.php


DC de 20/5/2011

sexta-feira, 13 de maio de 2011

Última ceia, com os desejos dos chefs

Para sua derradeira refeição, o chef Fergus Henderson, do St. John de Londres, filósofo da escola "Do Focinho ao Rabo", defensor ferrenho da carne de porco, gostaria mesmo é de um ouriço do mar banhado em vinho moscatel. Na taça, um excelente tinto da Borgonha. E queijo de cabra, entre uma e outra colherada de sorvete cremoso de chocolate. Para arrematar, café forte e Vieille Prune, esse néctar de ameixas. Desejos como esses de Henderson são a base do livro da premiada fotógrafa Melanie Dunea,My Last Supper , editado em 2007. A obra lista depoimentos sobre uma hipotética última ceia de 50 chefs que realizam sonhos gastronômicos de comensais em todo mundo. O segundo livro de Melanie, My Last Supper: The NextCourse, já está no prelo e deve ser lançado em setembro de 2011, navegando no sucesso que essas listas sempre fazem. Paul Kahn, do Blackbird, Avec, de Chicago, se concentraria diante de um suculento leitãozinho assado, com macarrão feito em casa pulverizado com trufas, tudo acompanhado de um Jean-Louis Chave, Cuvée Cathelin, 1990 (tinto do Rhône). Mais uma salada de escarola temperada com limão, queijo, grappa e chocolate suíço. Mario Batali, que comanda restaurantes em Nova York (o Babbo é o de maior destaque), Los Angeles e Las Vegas, faz da sua lista um verdadeiro banquete, com dez pratos de frutos do mar, pasta e vegetais. A começar com anchovas e aliches marinados servidos com uma pequena bruschetta, harmonizados de maneira mais que específica com o vinho Furore da lavra de Marisa Cuomo, de Ischia. Batali destaca também o Scialatielle ai Gamberetti, com a exclusivíssima pasta encontrada somente na cidade de Amalfi. Para essa hora, há de estar reservadas várias garrafas de Fiano di Avellino, branco da Campânia. De sobremesa, Baba ao Rum, Affogato al Caffe, e um "oceano" de limoncello bem gelado.

DC de 13/5/2011

quinta-feira, 5 de maio de 2011

Democráticos da Califórnia

Stephen Brook, colunista da Decanter, grande admirador de vinhos franceses, defensor do conceito de terroir, é o autor do quarto volume da coleção de guias de regiões vitivinícolas do mundo, idealizada pelo crítico inglês Hugh Johnson e editada pelo time da revista The World of Fine Wine. Importante destacar, entretanto, que Brook assina um livro sobre vinhos e produtores da Califórnia. O jogo de idéias é interessante: com o conhecimento das regras que fazem da vitivinicultura européia um empreendimento de respeito e tradição, Stephen Brook é capaz de reconhecer e dar valor a um ponto importante da indústria do vinho californiano, justamente a liberdade de ação dos produtores dessa região ensolarada dos Estados Unidos. Em The Finest Wines of California, Brook mostra o que há de mais californiano nos vinhos de Mendocino, Vale do Napa, Sonoma, Sierra Foothills, Santa Cruz Mountains, Monterey, San Luis Obispo e Santa Barbara. O que possibilita a produção de vinhos de classe internacional nessa parte do país, ele explica, é antes de tudo a proximidade do Oceano Pacífico, que modera o clima com sua brisa constante. Ao lado desse ponderador climático, há a própria formação e origem dos vinicultores. Enquanto na Europa eles geralmente herderam terras e ofício, na América a maioria migrou de outras profissões (executivos de finanças, por exemplo), levando investimentos e muita tecnologia ao campo. Menos apegados às tradições, de olho nos resultados e balanços, não têm medo de atender a demandas (lembram-se da euforia em relação ao Pinot Noir após a temporada do filme Sideways?) e nem de cair em tentativas e erros. Se os críticos dizem "muito carvalho", ágeis, quase sem protocolos, passam a produzir vinhos com menos tempo de barrica. E é nesse espaço de experimentação que nascem algumas preciosidades que disputam o mercado mundial (quando há produção para isso, já que a maioria das garrafas é consumida em casa mesmo). Brook destaca os Cabernet do Vale do Napa, os Pinot Noir de Sonoma, os Chardonnay de Santa Barbara e o Syrah de Paso Robles. Sem contar os vinhos únicos da uva de coração, a Zinfandel. No final do livro, após os perfis de produtores, o autor lista os melhores vinhos que encontrou na sua peregrinação pela Califórnia. E faz um comentário sobre as safras da região, de 1990 a 2009.

Diário do Comércio de 6/5/2011

Sede e fome de monge

A gastronomia e o mundo dos vinhos certamente devem uma parte de seu desenvolvimento aos monges e frades desde a Idade Média. Eles ajudaram, principalmente, a preservar antigas receitas e criar novas fórmulas para outras tantas – muitas sopas e preparações do fundamental peixe nasceram entre uma e outra oração nos monastérios. E dedicavam-se de corpo e alma a seus vinhedos. Durante os festejos do casamento de Catarina de Valois e Henrique V da Inglaterra, o arcebispo de Sens, encabeçando uma procissão de padres, levou ao quarto real sopa e vinho, acompanhados com benção papal. Boa imagem da importância desses dois caldos. Muitos dos tratados de cozinha e sobre vinhos desse período têm como autores dignatários da Igreja, vários exemplares escritos por devotos alemães. Eram capazes de relacionar os melhores vinhedos de sua época e de sua terra: Johannisberg, Steinberg, Hochheim... do Reinghau, mas também falavam das parreiras da Francônia, de onde saíam os vinhos Stein e Leisten. Não menos celebrados pelos clérigos eram os néctares da Côte D'Or (Romanée, Chambertin e Clos-Vougeot), do Rhône (Hermitage e Château-neuf-du-Pape), de Gironde (Saint-Emilion e Sainte-Croix-du-Mont, assim como os caros do Haut-Médoc. O celebrado vinhedo de Clos-Vougeot, propriedade primeira dos monges bernardinos, antes de ser declarado propriedade nacional por Napoleão, rendeu boas histórias. Algumas delas foram compiladas pelo estudioso americano George H. Ellwanger em The Pleasures of the Table, em 1902. (Uma edição fac-similar dessa obra foi editada pela Universidade de Cornell, nos EUA) Contam que Dom Gobelot, então responsável pela adega de Clos-Vougeot, foi forçado a se retirar para Dijon, mas levou com ele centenas de garrafas como souvenir. E quando o jovem Napoleão, conquistador da Itália, ao voltar da Batalha de Marengo, requisitou alguns safrados Vougeot para sua mesa, não teve dúvidas em responder: "Se ele quiser algum Vougeot de 40 anos, peça para que venha beber aqui, pois não estão à venda". E um abade desse mesmo monastério foi nomeado cardeal pelo papa Gregório XVI, em gratidão
a um presente – uma cesta de vinhos.

DC de 29/4/2011