sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

Os saltos das rãs

Há muitos saltos na história da vinícola Frog’s Leap, em Rutherford, uma das regiões mais prósperas da Califórnia. A começar da terra onde ela nasceu, área de uma antiga fazenda de criação de rãs, ao norte de Santa Helena. Nessa região criavam-se rãs desde o século 19. E na virada para o século 20, houve um verdadeiro boom, sendo uma atividade das mais lucrativas nesse então meio perdido oeste dos Estados Unidos. Revistas da linha “how to” das primeiras décadas já vendiam suas receitas de como enriquecer com rãs. Ainda não havia a efervescência da vitivinicultura. O nome da vinícola criada em 1975 por Larry Turley e John Williams é homenagem declarada aos velhos tempos, nos quais uma perninha de rã americana tinha o mesmo status das consumidas avidamente pelos gourmets da era vitoriana, como conta a escritora Tanya Scholes. Hoje quem toca os 56,5 hectares de sustentáveis vinhedos da Frog’s Leap é John Williams, inspirado em práticas zen e biodinâmicas (isso combina muito bem com sapo!). Larry “saltou” da sociedade para administrar um projeto próprio, com vinhos Zinfandel de alto padrão, muito “musculosos” e fortes, isso na mesma velha área das velhas rãs. A Turley Wine Cellars fica na na Highway North. Conclui-se então que, na verdade, quem saltou dali foi John Williams, que levou consigo para Rutherford o direito do uso da rã e da marca. A nova vinícola foi instalada num antigo celeiro vermelho, que nos anos 1940 serviu para estocar ameixas e amêndoas. Os vinhos da Frog’s Leap são mais leves, mais elegantes, e é assim que eles têm se destacado. Na primeira safra comercial da vinícola, de 1981, foram lançadas no mercado 700 caixas de Sauvignon Blanc e Zinfandel, esta a cepa emblemática da viticultura americana. No início, as uvas eram transportadas (“pulavam”) dos vinhedos da Stag’s Leap (onde Williams tinha anteriormente trabalhado) para os tanques da Frog’s Leap. As garrafas de Cabernet Sauvignon, atualmente muito apreciadas, apareceram somente quatro anos depois. Hoje a Cabernet sai de vinhedos próprios, que desde os anos 1990 foram convertidos em orgânicos. Williams também trabalha com Merlot e com uma quantidade pequena da Petite Sirah. Vinhos não tão midiáticos como os de Turley, mas muito bem feitos e honestos que podem ser encontrados em vários bons restaurantes na Califórnia. A Frog’s Leap produz, em média, 700 mil garrafas a cada safra. E Williams não para de experimentar. O crítico Stephen Brook, da revista Decanter, conta que o viticultor mantém o bom-humor e chegou a produzir um Chenin Blanc pouco alcoólico que batizou de Leapfrögmilch (divertida paródia com os Liebfraumilch alemães) e até um estiloso Frögenbeerenauslese, este para emular os grandes Riesling, mas produzidos com uva botitrizada em plena área de Rutherford, uma das maiores apellations do Vale do Napa. Nos rótulos de John Williams, desde sempre, o elegante salto da rã. A criação é de Chuck House, que viria a ser um dos maiores designers de rótulos dos Estados Unidos. Tanya Scholes conta, em The Art and design of Contemporary Wine Labels/Santa Monica Press/2010), que a criação foi paga, evidentemente, com um par de dólares e outro par de caixas de vinho. Já o saltitante e informal moto da casa, “Time’s fun when you’re having flies”, é emprestado da seleção de citações do famoso sapo Kermit, o primeiro dos Muppets. O slogan “batraqueia” o ditado original “Time flies when you’re have fun”. E o tempo voa na Frog’s Leap. Williams e Lilly, a rã pet da vinícola, que coaxem seus tempos de prazer. Sapos também podem ser vistos no rótulo do vinho da uva Tsapournakos, da vinícola grega Voyatzi, da Macedônia, e na garrafa de um blend tinto da vinícola Twisted Oak, em Sierra Foothills, na Califórnia. No primeiro caso, o sapo coroado precisa de um beijo para virar príncipe. Tradução proposta: é preciso degustar a desconhecida Tsapournakos para mostrar sua escondida nobreza. O sapo da vinícola californiana homenageia um das histórias do grande escritor americano Mark Twain, “The Celebrated Jumping Frog os Calaveras County”. Dc de 13/12/2013

domingo, 8 de dezembro de 2013

Spätburgunder, a Pinot que fala alemão.

A Spätburgunder, sonoro nome da Pinot Noir na Alemanha, tem sido, nos últimos dez anos, a segunda grande força da viticultura de um país acostumado aos elogios por seus inconfundíveis vinhos da uva Riesling. Os números não mentem: a Alemanha continua a ser o maior produtor da Riesling, com 22.601 hectares de vinhedos, o que corresponde a 62,5% do total mundial. Variedade que produz excelentes vinhos e uma enxurrada de adjetivos. O Riesling é gracioso, fresco, cristalino, puro, refrescante, delicado, balanceado, frutado, mas também mineral. Os apreciadores desse vinho branco sabem muito bem disso tudo. Já sobre a Spätburgunder sabem menos, apesar de a cepa estar muito bem na classificação. A Alemanha já é o terceiro maior produtor da Pinot Noir, ficando atrás no ranking somente para a França e os Estados Unidos. São 79 mil hectares - 14,3% da área plantada em todo mundo. Em 1980, a Alemanha tinha somente 3,8% de vinhedos com a Pinot. Em 2008, essa porcentagem batia em 11,5%. Também estão em ascensão os vinhos alemães das uvas Silvaner, Weissbutgunder (Pinot Blanc) e Grauburgunder (Pinot Gris). A Spätburgunder é cultivada em território alemão desde o século XIII. Os mesmos monges cistercienses que a plantavam na Borgonha, também cuidavam da cepa ao longo do Reno. Por que então a Spätburgunder nunca foi mencionada com a mesma reverência da Pinot da Borgonha? É que, enquanto a Pinot Noir está perfeitamente casada ao terroir da Côte D'Or, na França, a Spätburgunder precisa lutar para amadurecer no clima mais frio da Alemanha, explica Eric Asimov, crítico do New York Times. Isso faz com que esse tinto alemão tenha seu charme, mas não a complexidade do vinho francês de mesma cepa. O que se assiste agora é à recuperação da antiga tradição, com os vitiicultores aproveitando a elevação das temperaturas no país. Os dois maiores nomes da Pinot hoje na Alemanha, segundo Asimov, são Klaus-Peter Keller, da Vinícola Keller, e Caroline Diel, da Schlossgut. A maioria de seus vinhos é composta de brancos, mas os tintos já estão em evidência em bons restaurantes de Nova York. "A mais elegante uva que temoos na Alemanha é a Riesling; a Pinot Noir é sua irmã", confessou Keller em entrevista a Asimov. Outros produtores de Spätburgunder de qualidade são August Kesseler, do Reinghau, e J.J. Adeneuuer, de Ahr. Nas famosas encostas do Mosel, uma das regiões da rainha Riesling, desde 1986 há vinhedos com Spätburgunder. Um deles, de grande qualidade, está integrado à Graacher Himmelreich, vinícola de Markus Molitor. A história da viticultura da Alemanha nasceu no Mosel, com os romanos, nos primeiros séculos da nossa era. Com historiadores e arqueólogos que os mandatários de Roma tiveram de plantar seus vinhedos na região de Trier , a chamada Roma Seconda, para aplacar a sede de milhares de sedentos legionários. DC de 6/12/2013