quinta-feira, 11 de setembro de 2014

Vida longa a Monsieur Nectar

Nectar, personagem da casa de vinhos francesa Nicolas, faz parte de uma verdadeira saga publicitária que toma fôlego com novo desenho e caminha para os 100 anos. O entregador capaz de carregar um número absurdamente grande garrafas nas mãos nasceu da pena de Dransy em 1922 e, desde então, mesmo durante a Segunda Guerra Mundial, comunicou-se de maneira eficaz com o consumidor francês, pintado em muros, impresso em catálogos e, principalmente, reinando em cartazes que tanto encantam a França. No primeiro desenho de Dransy, Nectar levava 16 garrafas em cada mão, indicando a disponibilidade da entrega e a variedade do catálogo de vinhos da Nicolas. O Nectar redesenhado em 2012 para marcar os 190 anos da cadeia de lojas mantém o avental, o boné e até o moustache do eficiente entregador, mas aliviou a sua carga para 8 garrafas. Grandes cartazistas do Entreguerras participaram da primeira etapa da história de Nectar: Iribe, Loupot, Cassandre, Brunhoff. Ficaram famosos também os catálogos de luxo, feitos para celebrações, entregues aos clientes no fim de cada ano, entre 1932 e 1973 (e também em 1992), com participação de renomados artistas: Van Dongen, Derain, Lorjou, Buffet, Chapelain Midy, Boisrond. Toda essa história foi contada e reunida por Alain Weill, especialista em arte publicitária, no livro Nectar comme Nicolas (Herscher/1986). Só ficou de fora mesmo o novo Monsieur Nectar, estilizado em 2012. Por tudo isso, Étienne Nicolas, que comandava a empresa familiar em 1922, quando Nectar foi lançado, é apresentado por Weill como um "gênio da comunicação", imprimindo seu ânimo de promoção dos vinhos durante 40 anos. Fundada em 1822, em Paris, apenas "um ano após a morte de Napoleão", como a empresa faz questão de frisar, foi a primeira loja especializada a vender e entregar vinhos de qualidade superior em garrafas, em tempo em que a bebida ainda era vendida por volume. Foi também a casa que lançou a ideia do Beaujolais Nouveau e pôs em circulação inúmeros vins de pays. Hoje, a casa, com mais 500 lojas somente em Paris e outras dezenas em outros pontos do globo, pertence ao grupo Grupo Castel, iniciado com negociantes e engarrafadores de Bordeaux, no final dos anos 40, e atualmente um dos maiores produtores de vinho do mundo. Não à toa, o velho Nectar foi parar no rótulo de um comemorativo Cabernet Sauvignon 2012. Em três anos de sucesso de "Nectar das 32 garrafas", Éttienne compreendeu que precisava dar-lhe uma nova dimensão. Associou-se a Draeger, um homem de peso na publicidade francesa da época, que começou a produzir encartes para jornais, com um Nectar modernizado, incorporado em elegantes traços cubistas. Com Draeger, Nectar também foi parar no cinema, em filmetes divertidos que antecediam a atração principal. Dransy assinou um contrato com Nicolas, em que autorizava o uso de seu personagem, desenhado posteriormente nos estúdios de Draeger, com o indicativo "d'après" Dransy. Nesse espírito, Nectar chegou a aparecer com seu ajudante Glou-Glou. Sua "literária" companheira Felicité não chegou a ser um sucesso. Na década de 30, Paul Iribe, precursor da arte déco e grande ilustrador, foi chamado por Étienne para produzir vários álbuns com sequências ao modo de quadrinhos, onde um indisfarçável Nectar aparece como sommelier. Nectar não se furtou a emprestar sua figura a todos os estilos e todo tipo de aventura. E até os anos 1960, quando ainda circulavam, tínhamos quase certeza de que era ele a dirigir o famoso triciclo da casa pelas ruas de Paris entregando os vinhos da Nicolas. DC de 12/09/2014

quinta-feira, 4 de setembro de 2014

A nova cara dos vinhos australianos

Muitas barricas vêm rolando na terra dos cangurus desde que o capitão Arthur Philip desembarcou, em 1788, no que é hoje o Porto de Sydney. Das primeiras tentativas de produção de vinho aos mais de 700 milhões de litros exportados anualmente para todo mundo passaram-se apenas 200 anos, rapidez e eficiência reveladoras de uma nação perseverante que se vale de muita experimentação e ciência para o manejo de seus vinhedos. A Wine Spectator de agosto, na pena do especialista Harvey Steiman, acaba de indicar um avanço dos Cabernet Sauvignon australianos no mercado americano, depois que os vinicultores conseguiram um equilíbrio na sua personalidade herbácea. Importante notícia, já que o Shiraz sempre fez sombra aos "Cab aussies". A mais nova expressão do dinamismo da vinicultura australiana, entretanto, é encontrada em jovens e estudiosos produtores de Victoria, reunidos no grupo South Pack. Fora do circuito global das grandes empresas, estão atrás de vinhos artesanais que melhor expressem o terroir daquele pedaço de Novo Mundo que tem solos de 500 milhões de anos. Vinhos que também mostrem como o australiano está tratando as novas variedades plantadas hoje no país, vinhedos que se misturam às mais antigas parreiras remanescentes do mundo, dos anos 1850. Em entrevista a Tim Wildman, publicada no blog Les Caves de Pyrène (mantido pela homônima importadora britânica), o viticultor Barney Flanders, da Allies, define o South Pack com uma antítese. O que o grupo está procurando NÃO FAZER é justamente vinhos excessivamente frutados, com a presença intensa do carvalho "adocicado", muito álcool e baixa acidez . Ele acredita que o mundo já se cansou dessa receita típica australiana, que fez muito sucesso num passado que é ainda muito presente. A produção do South Pack é, portanto, uma reação aos "pesados" vinhos dos anos 90, comparável à revolução ocorrida nos Estados Unidos com o movimento "New California", escreveu Julia van der Vink, em Punch. O South Pack foi criado em 2006 para somar as forças de promoção das garrafas de pelo menos oito vinicultores independentes, que trabalham com vinhedos principalmente no Yarra Valley, Mornington e Gippsland, ao sul da região de Victoria. São eles: Mac Forbes (Mac Forbes Wines), Timo Mayer (Mayer) Gary Mills (Jamsheed), James e Clare Lance (Punch), Barney Flandres e David Chapman (Alliens e Garagiste), Adam Forster (Syrahmi), Luke Lambert (Luke Lambert Wines), Bill Downie (William Downie). Muitos deles estão concentrados no Yarra Valley, que tem a uva Pinot como "cepa de inovação". Os Pinot de Mac Forbes foram parâmetros dessa revolução. Luke Lambert, por sua vez, além dos Shiraz, faz vinhos da italianíssima uva Nebbiolo, em Heathcote, assim como Gary Mills produz boas garrafas de Gewürztraminer e Viognier. Essas novas apostas convivem com as mais tradicionais cepas da vinicultura local, que são Shiraz, Cabernet Sauvignon (que gosta da terra roxa de Cononawarra) e Chardonnay. Depois daquela árdua viagem oceânica de oito semanas, uma das primeiras atitudes do capitão Philip (logo guindado a almirante e que seria o governador da colônia britânica New South Wales), foi plantar, com a força dos seus "condenados" o que restava das mudas que trazia na embarcação. Entre as plantas, vinhas do Cabo da Boa Esperança e do Brasil. Pois se a Grã-Bretanha não tem exatamente uma história das mais vibrantes da indústria do vinho, sempre foi um grande reino de consumidores e, no século XVIII, já era um porto de muitos negociantes da bebida. Havia uma ideia, sobrejacente à da conquista territorial, de que a Austrália poderia ser o "vinhedo da Inglaterra", explica Max Allen em Crush (Mitchell Beazley/2000). Como aquele ponto da Austrália era muito quente e úmido, as tentativas de produzir vinho ali fracassaram. O primeiro vinhedo produtivo e a primeira vinícola comercial vieram décadas depois, já no início do século XIX. Até os anos 1960, aproximadamente 80% dos vinhos australianos eram fortificados, na linha do Sherry e do Porto. Eram conhecidos na Inglaterra como "vinho colonial". Foi depois da Segunda Guerra que o perfil dos vinhos locais foi sendo alterado, graças aos imigrantes italianos, gregos e alemães, que gostavam dos vinhos à mesa, para acompanhar as refeições. O primeiro grande vinho australiano saiu das mãos de Max Schubert, da vinícola Penfold, em 1951: o safrado "Grange". Depois dele, a vinicultura australiana nunca mais foi a mesma. TERREMOTO - O espírito de um movimento social que os americanos conhecem bem (neighbors helping neighbors) tomou conta de produtores de vinho reunidos no Napa Valley Vintners, que anunciou a doação de US$ 10 milhões para a criação de um fundo destinado às vítimas do terremoto que atingiu a Califórnia, incluindo vinhedos de Napa, em 24 de agosto. O dinheiro vai para reconstrução de moradias e negócios.BRASILEIROS - O Novo Guia Adega de Vinhos do Brasil (2014-2015) acaba de ser lançado pela Editora Inner em parceria com a revista Adega. Foram avaliados cerca de 580 vinhos, de mais de 60 vinícolas de todo País. A publicação oferece ainda um resumo das principais regiões vitivinícolas e um ranking de rótulos de maior destaque. http://lojainner.com.br/guiaadegavinhosdobrasil2013-2015.html DC de 5 de setembro de 2014