domingo, 21 de junho de 2009

Nush! Saudades da Pérsia

Muito distante das intolerâncias do atual Irã, a vida e as alegrias da antiga Pérsia mantêm-se muito vivas na poesia de Hafiz, Khayam, Rumi... Foram eles que descreveram as cerimônias de degustação de vinhos, em salões atapetados, ao som de pequena orquestra de músicos "coroados" com tranças de mirto. Grandes decanters, ricamente adornados, eram colocados entre os bebedores. E a figura solene de um saqi (o sommelier persa) tratava de encher as taças ou as cumbucas de ilustres convidados. Depois, o brinde: Nush! (da palavra anush, que significa vida eterna). Eram três as rodadas oficiais da bebida. A primeira, para bons pensamentos. A segunda, para as boas palavras. A última, para boas ações. Najmieh Batmanglij relata em From Persia to Napa (Mage Publishers/2006) como o ritual de degustação de vinhos era importante. Na época de Nezam al-Moek, governante no século XI, os saqi indispensáveis nas cortes e nas casas aristocráticas, tinham de vencer um treinamento de seis anos, geralmente iniciado na infância. Jovens amigáveis e de boa aparência (e daí o erotismo com que a poesia persa os embala) tinham de aprender poesia, ter habilidade para cavalgar e conhecer armas. Mas o principal: ter talento para conhecer o bom vinho e para guardá-lo adequadamente. Outra função: cuidar para que os instrumentos musicais (harpas, violinos, flautas e tambores) estivessem sempre em boas condições para o espetáculo. A cumbuca de ágata desta página traz uma inscrição em homenagem ao lendário rei iraniano Jamshid, "pioneiro da vinicultura". Pertencia a outro soberano, o sultão Husayn (séc. XVI), curiosamente retratado com a peça em um festival de vinho, música e dança com seu harém.

Diário do Comércio 19/6/2009

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