sexta-feira, 4 de julho de 2014

Amigos da Bairrada

O mundo inteiro conhece a uva Baga, mesmo sem que ela tenha sido devidamente apresentada, como agora tratam de fazer os integrantes do grupo Baga Friends. Esses produtores da Bairrada, uma das regiões vinícolas na faixa litorânea de Portugal, há um par de anos arregaçaram as mangas para promover o que a casta pode conseguir de melhor: taninos macios para vinhos tintos de guarda de qualidade. Na lista dos “amigos da Baga” estão o respeitado vinicultor português Luís Pato (Vinícola Luís Pato), sua filha Filipa (Vinícola Filipa Pato), Mário Sérgio Nuno (Quinta das Bágeiras), Paulo Sousa (Vinícola Sidónio de Sousa), António Rocha (Vinícola Bugaço), João Póvoa (Vinícola Kompassus), François Chasans (Quinta da Vacariça) e Dirk Niepoort (Quinta do Baixo e famoso produtor de vinhos do Porto e do Douro). “A Baga é uma diva” que pode ser comparada à uva Nebbiolo, dos italianos Barolos, e à Pinot Noir dos Borgonhas, avalia Sarah Ahmed, especialista em vinhos portugueses da revista britânica The World of Fine Wine. No início do ano, três vinhos do Baga Friends foram escolhidos por Joshua Greene, editor e publisher da Wine and Spirits, para a lista dos 50 grandes vinhos para o mercado americano. E o “Oscar do vinho português de 2013”, entregue pela Revista de Vinhos em fevereiro, também alcançou três rótulos desses fãs incondicionais da Baga. Quando se diz que todos conhecem a Baga, mesmo sem saber, é porque essa variedade portuguesa está por trás do popularíssimo Mateus Rosé. Desde que foi lançado, em 1942, perto de um bilhão de garrafas desse vinho foram vendidas em mais de 120 países, sendo responsável pela iniciação etílica de muita gente. A idéia de um vinho global como o Mateus Rosé foi do empreendedor Fernando Van Zeller Guedes, fundador do grupo Sogrape, hoje com um eclético portfólio, formado depois de uma série de aquisições. No Brasil, o fresco e versátil Mateus Rosé (com a tradicional garrafa em estilo “flask”, semelhante à dos vinhos alemães da Francônia) foi febre nos anos 1960/1970, em tempo de poucas opções e exigências. A maioria dos cerca de 2.000 produtores de Baga na Bairrada, uma das regiões vinícolas de Portugal onde é mais cultivada, ao lado da Beira, ainda trata de colhê-la mais cedo para os rosés, evitando o risco da colheita em setembro, época de chuvas. A Bairrada tem marcante influência atlântica, com clima muito úmido. Com isso, um dilema se instala, já que uvas para tintos da Baga teriam de amadurecer por mais tempo nas videiras. Luís Pato, por exemplo, dribla o clima com uma “colheita verde”, descartando cachos quando estes começam a mudar de cor, e fazendo com que os remanescentes ganhem em concentração. Ele também ganhou em qualidade ao fermentar as bagas sem os caules e ao “arredondar” os taninos em barricas de carvalho francesas. Já a filha Filipa garantiu tipicidade a seus vinhos a partir de plantas mais antigas. Como escreve Sarah Ahmed, a culpa dessa conjuntura desfavorável aos tintos varietais não pode ser atribuída somente ao mar de rosés. Houve uma queda de qualidade geral na indústria vinícola portuguesa após a Revolução dos Cravos, em 1974. Os vinhos eram então vendidos a granel para colônias na África, por negociantes e cooperativas que dominavam a produção da Bairrada. (Exceção deve ser feita aos vinhos garrafeira, principalmente os da Caves São João Frei João, que mantiveram regras de vinificação). A área vinícola cresceu e perdeu em qualidade. Era preciso reverter o quadro. Em 1979, a Bairrada conseguiu seu devido status de região demarcada. Anos depois, com a volta da democracia e a integração de Portugal à Comunidade Europeia (1986), os vinhedos e os negóciospassam a ser restaurados. Começa então a “Revolução da Baga” liderada pelo incansável Luís Pato, tão presente no Brasil. O vinicultor também faz com a Baga um espumante ideal para celebrar todas vitórias do Baga Friends. NA ÂNFORA - Filipa Pato lançou em São Paulo, no início do ano, vinhos da uva Baga que envelhecem em duas ânforas de cerâmica de 300 litros, enterradas no solo. O Post Quercus Baga 2013 é feito na Bairrada a partir de vinh edos velhos. As mesmas plantas dão origem a outro vinho de Filipa, o Nossa Calcário, feito em parceria com William Wouters, o marido belga que é sommelier, no escopo do projeto Vinhos Doidos. BUSSACO - Os últimos reis de Portugal dormiram nesse castelo (acima), na Bairrada, transformado no Palace Hotel do Bussaco e que acaba de ser reconhecido como um dos "10 hotéis top para os amantes do vinho" ,pela revista inglesa The Drink Business. Vinhos do Buçaco, da tinta Baga, estão guardados na adega da propriedade desde que começaram a ser feitos, em 1920. www.bussacopalace.com/ Diário do Comércio de 4/7/2014

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