quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

Colecionadores proverbiais

Nem só de coleções de grandes garrafas gira o universo dos apreciadores de vinho. Há enófilos que se tornam também helixophiles, batizados com a palavra culta e específica que une paixão e espirais. Os helixophiles colecionam saca-rolhas, dos mais antigos, principalmente do século XVIII, a peças exclusivas e contemporâneas, assinadas por designers, e que – eureca! – , também conseguem abrir garrafas. A Christie’s de Londres, famosa pelos leilões de vinhos, duas vezes por ano também coloca no pregão saca-rolhas “safrados”. Alguns “viciados” se reúnem na International Correspondence of Corkscrew Addicts (ICCA). E há colecionadores-pesquisadores que editam catálogos ao estilo raisonné, como o The Ultimate Corkscrew Book (Schiffer Book/1999), de Donald A. Bull. Rótulos de vinhos também podem virar uma paixão (em que pese as operações nem sempre bem-sucedidas de desgrudá-los das garrafas). Alguns colecionadores os tratam com rigor historiográfico. Outros, como o inglês Peter F. May, gostam de reunir rótulos inusitados e bem-humorados. No seu pocket book Marilyn Merlot and Naked Grape (Quirk Books/2006), May põe lado a lado rótulos cultuados e provocativos da californiana Bonny Doon (Ceci n’est pas un Carignan é um clássico) e ingênuos como o Nero di Predappio, da Emilia-Romagna, com a estampa de Mussolini! Há também quem beba em provérbios, ditados e aforismos sobre vinhos e sobre sua lida. O engenheiro Carlos Moura, do Parque Tecnológico da Univap, em São José dos Campos, termina seus e-mails com o tão célebre quanto anônimo “Life's too short to drink bad wine”. Palavras que compõem uma filosófica fortuna crítica do dia a dia de vitivinicultores e consumidores da bebida. Muitas vezes pescadas na literatura, mais ainda nos registros de festas populares e de vindimas. José Roberto Whitaker Penteado, em seu alentado O Folclore do Vinho (Centro do Livro Brasileiro/Lisboa/1980) reuniu nada menos do que 200 provérbios brasileiros sobre vinhos, naturalmente herdados dos portugueses, sem contar outras tantas máximas de espanhóis e italianos. “Ao bom amigo, com teu pão e com teu vinho”; “Bebe vinho, mas não beba o sizo”; “Vinho a seis, cabra a três”; ”Quando vinho desce, as palavras sobem”. Talvez esse último provérbio seja a nossa versão para o clássico In vino veritas. Renzo Tosi, no seu rigoroso Dicionário de Sentenças Latinas e Gregas. (Martins Fontes/2010), organiza uma lista de ditados sobre o vinho, inaugurada com a sempre presente máxima: “No vinho, a verdade”. Se não há menção literal desse ditado em nenhum autor latino clássico, Renzo explica que há paralelos entre vinho e verdade tanto em Horácio quanto em Plínio. A conhecida versão, traduzida em praticamente todas as línguas do globo, foi difundida a partir da Idade Média. In vino veritas ganhou as letras de Rabelais e batizou parte de um estudo de Kierkegaard sobre o caminho da vida (1845), aquele que trata de cinco convivas de um banquete, que abrem a alma sobre o amor. “O que permanece no coração do sóbrio está na língua do bêbado”, registrou Plutarco. DC de 8/02/2013

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