domingo, 11 de dezembro de 2016

Garrafa Melquizedeque e Abraão

As grandes garrafas de vinho, com seus nomes de referências bíblicas, chamam minha atenção. As informações sobre sua gênese sempre estiveram difusas, mas ganharam novos contornos no livro Divine Vintage (Palgrave Macmillan/2012), de Randall Heskett e Joel Butler. A maior de todas as garrafas, a garrafa de 30 litros, onde cabem o volume de 40 garrafas de 750 ml, é chamada de Melquizedeque. E não é à toa.

Intencional ou não, esse batismo tem grande simbolismo, marcando um momento importante da história do vinho. Em seu caminho de Ur para Israel, o patriarca Abraão encontrou-se com Melquizedeque, rei de Salem (de Jerusalém), na cidade de Shaveh. Foi quando Melquizedeque lhe serviu pão e vinho dos vinhedos locais. Duas culturas, a canaanita e a hebreia, desafiando padrões de animosidade, se encontravam pela primeira vez diante do vinho, em paz. Abraão vinha da terra da cerveja, da Mesopotâmia transbordante dos rios Tigre e Eufrates, e o vinho de Canaã, com todo seu peso cultural, pode ter sido um ponto de inflexão.

Nomes e tamanhos das garrafas

Melquizedeque --- 30 litros, 40 garrafas (de 700 ml)

Primat -------------- 27 litros, 36 garrafas

Sovereign ---------- 25 litros, 33,3 garrafas

Salomão ------------ 20 litros, 28 garrafas

Melchior ----------- 18 litros, 24 garrafas

Nabucodonosor ---15 litros, 20 garrafas (Champagne)

Baltasar ------------ 12 litros, 16 garrafas (Champagne)

Salmanazar -------- 9 litros, 12 garrafas

Matusalém --------- 6 litros, 8 garrafas (Borgonha)

Impériale ------------ 6 litros, 8 garrafas (Champagne)

Rehoboam --------- 4,5 litros, 6 garrafas

Jeroboam ---------- 3 litros, 4 garrafas (Bordeaux)

Double Magnum - 3 litros, 4 garrafas (Borgonha e Champagne)

Marie-Jeanne ----- 2,25 litros, 3 garrafas (Champagne)

Magnum ----------- 1,5 litros, 2 garrafas

Standard ----------- 750 ml, 1 garrafa

Demi ou Split ----- 375 ml, meia-garrafa

Piccolo ------------- 187 ml, um quarto de garrafa

O aprofundamento histórico sobre os nomes dessas garrafas tem tudo a ver com a própria formação de um dos autores. Randall Heskett é professor universitário e um biblical scholar com formação em Velho Testamento pela Universidade de Yale e Universidade de Toronto. Ex-importador de vinhos, escreveu diversos livros e artigos, incluindo Reading the Book of Isaiah: Destruction and Lament in the Holy Cities (Palgrave Macmillan/2011).

Segundo Tom Stevenson, respeitado autor de The World Encyclopedia of Champagne and Other Sparkling Wines (Wine Appreciation Guild/ 2003), a mais antiga garrafa com nome bíblico é a Jeroboam, usada em Bordeaux pelo menos desde o século XVIII. As demais, com capacidades que ultrapassam 1,5 l ( Magnum), foram nomeadas a partir dos anos 1920.

Jeroboam foi o primeiro rei de Israel (922-901 a.C.), depois do sucesso da revolta das dez tribos do norte contra Rehoboam (o da garrafa de 4,5 litros), que resultou num reino dividido, Rehoboam à frente de Judá. Os autores conjecturam que a escolha de Jeroboam tenha ocorrido porque um dos seus vícios era, talvez, beber demais. Há também a possibilidade de tudo não passar de puro marketing,
tática que os produtores de Champagne conhecem muito bem.

Os pilotos da Fórmula I costumam subir ao podium ostentando garrafas Jeroboam, com 3 litros de Champagne (double Magnum). Sempre foi Champagne. Mas depois de 15 anos como símbolo da premiação da F-1, a vinícola G H Mumm perdeu o lugar no contrato para a australiana Chandon, submarca da Moët & Chandon. E como Champagne é só o vinho de Champagne...











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