terça-feira, 1 de dezembro de 2015

Nas taças de Canaã

Brad Whittington, texano filho de pastor e formado numa comunidade batista que sempre atuou com rigidez no combate ao consumo de álcool, analisa friamente em What Would Jesus Drink? - What the Bible Really Says About Alcohol (Wunderfool Press/2011) as citações bíblicas sobre o vinho. Faz questão de distinguir a letra do texto bíblico das regras de tradição, culturais, de cada igreja cristã. Para ele, uma coisa é condenar o consumo, como ele mesmo o faz, considerando as estatísticas dos estragos sociais relacionados ao alcoolismo ou ao abuso eventual das bebidas alcoólicas. Outra, muito diferente, é pregar a abstinência apropriando-se de citações e, principalmente, transformando o vinho bíblico em vinho sem álcool, sempre quando necessário na defesa de teses religiosas. O vinho e outras “bebidas fortes” aparecem na Bíblia (Velho e Novo Testamentos) em 247 citações, em referências negativas, positivas e neutras, estas muitas vezes simbólicas. Estou como vinho arrolhado, Como odres novos prestes a romper. Jó, 32:19 Whittngton diz que quase caiu de costas quando fez as contas e descobriu que 58% das citações eram positivas. “Eu nunca tinha ouvido um sermão positivo sobre o vinho e nunca esperava esse resultado”, escreveu. Também foi pego de surpresa ao detalhar os conteúdos. São 58 as referências nas quais o vinho aparece, sem qualquer condenação moral, como parte integrante do dia a dia da época de Jesus, e 47 as que tratam da abundância do vinho como bênção de Deus. Deveria eu renunciar ao meu vinho, que alegra os deuses e os homens (...) Juízes, 9:13 A maioria das 40 citações bíblicas negativas ao álcool condenam seu consumo excessivo. Não se embriaguem com vinho, que leva à libertinagem (...) Efésios, 5:18 A conclusão final de Whittington: “a posição das escrituras dá ênfase ao consumo moderado do álcool com um alerta contra a embriaguez”. E se há tantas alusões contra a embriaguez e pregação por abstinência, como pensar que nas mesas da época as jarras e as ânforas estavam cheias de suco de uva, como querem algumas igrejas? As ânforas da festa de casamento de Canaã, a do milagre da água transformada em vinho, certamente continham a bebida embriagante. O pastor Roberto Cruvinel, da Igreja Assembléia de Deus Pleroma, de São Bernardo do Campo, em outras circunstâncias, também teve a mesma reação de perplexidade de Whittington. Cruvinel disse certa vez, num programa de rádio, que tinha se convencido da natureza alcoólica dos vinhos bíblicos ao ouvir de Henrique Murachco, seu renomado professor de grego na Universidade de São Paulo, que a palavra oinos do texto bíblico em língua grega deve ser traduzida definitivamente por vinho, o que tem álcool.

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