quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

Fugacidade de pirilampo

"O mundo realmente precisa de outro livro sobre vinhos?”, pergunta Eric Asimov na primeira linha do seu novo livro... sobre vinhos How to Love Wine – a Memoir and Manifesto (Harper Collins Publishers/2012). A provocação do crítico-chefe de vinhos do New York Times (nada mais do que "o cara dos vinhos", como ele próprio debocha da pomposidade do seu título, responsável que é por uma seção de jornal de um homem só), tem muito a ver com a overdose de publicações do tipo "conheça-tudo-sobre-vinhos-para-não-fazer-feio-na-festinha" ou aqueles ditos livros mais sérios que prometem "desmistificar" a bebida em não mais de 10 capítulos, e que quase sempre caem em desditosas simplificações. Mais que tudo, seu "manifesto" é, como costumam ser seus artigos, um elegante tapa com luva de pelica na crítica esnobe e elitista. Pois, pasmem! Insuspeitadamente, o celebrado crítico Asimov diz, com todas as letras, que não é preciso conhecer nem toda história, nem todo pretensioso jargão, nem toda a parafernália de saca-rolhas e cristais, muito menos os festivais de rankings incensados pelo mercado para ter prazer com o vinho. É claro que reconhece que a companhia do conhecimento pode ajudar na amplificação dos sentidos. Mas diz que isso não precisa vir em primeiro lugar e tampouco pode ser imposição inibidora. Seu livro está mesmo do outro lado do balcão, atestando o mote "a mesa antes do manual", reforçando que o real prazer está em abrir garrafas, de preferência diante de uma comida maravilhosa, compartilhando-as com amigos e familiares. Asimov certamente entende o desafio da crítica e a valoriza quando cumpre seu papel de indicar possibilidades nesse mercado que nunca antes teve tantos e bons vinhos a oferecer. Mas indicar não é, para ele, questão de decretos (só este ou só aquele rótulo, só este châteaux, só aquele produtor histórico, não aquele apaixonado, de garagem) e nem pode se basear exclusivamente em experiências requintadas e especiais. Como distantes estão as garrafas dos melhores e históricos Bordeaux e Borgonhas (cada vez mais raros e caros diante da fúria dos novos-ricos chineses e russos), é preciso mostrar que há vida inteligente, por exemplo, fora dos châteaux e do Velho Mundo. E Asimov admite, sem subterfúgios: o vinho degustado e descrito pelos críticos, o que estes encontraram naquela taça do mais fino cristal, num dia "xis", num salão ou restaurante mais ou menos empoado e estrelado, pode estar anos-luz do vinho bebido pelo mortal apreciador de vinhos em sua mesa informal, com amigos, pães e queijos, numa taça não necessariamente Riedel. Sem contar que a "variação do gosto" pode se dar numa onda ainda mais curta, no período da refeição ou do encontro, quando o vinho é capaz de vibrar e criar surpresas, epifanicamente, com a rapidez e a fugacidade de um pirilampo. DC de 18/1/2013

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